Numa linda noite estrelada, o cacique de uma de nossas tribos estava sentado à beira da lagoa, admirando a beleza da flor, quando as crianças chegaram e lhe pediram para contar uma história. Ele apontou para a vitória-régia e lhes disse que ela era uma estrela.
As crianças ficaram curiosas e confusas. O cacique se apressou, então, em contar:
Em nossa tribo, vivia uma índia, muito moça e muito bonita, a quem haviam lhe contado que a lua era Jaci, um guerreiro forte e poderoso.
A moça apaixonou-se por esse guerreiro e não quis casar-se com nenhum dos índios da tribo. Não fazia outra coisa senão esperar que a lua surgisse. Aí, então, punha os olhos no céu e não via mais nada. Só o poderoso guerreiro.
Muitas vezes, ela saía correndo pela floresta, os braços erguidos, procurando agarrar a lua.
Uma noite, em que o luar estava mais bonito do que nunca, transformando em prata a paisagem da floresta, a moça, chegando à beira da lagoa, viu a lua refletida no meio das águas tranquilas e acreditou que Jaci havia descido do céu para se banhar ali.
Sem hesitar, a moça atirou-se às águas profundas e nadou em direção à imagem da lua. Quando percebeu que havia sido ilusão, tentou voltar, mas as forças lhe faltaram, e ela morreu afogada.
O deus guerreiro forte e poderoso, Jaci, se compadeceu de sua dor e grande amor. Já que não poderia transformá-la numa estrela lá do céu, podia transformá-la numa estrela das águas. Uma flor que seria a rainha das flores aquáticas.
E, assim, a formosa índia foi transformada na vitória-régia. À noite, essa maravilhosa flor se abre, permitindo que a lua a ilumine e revele sua impressionante beleza, branca feito uma estrela a brilhar nas águas do Brasil.
E assim, o amor platônico não se concretiza, permanecendo como uma linda cena, uma bela imagem não realizada, mas que enfeita, reafirmando para sempre o quanto é belo o amor e suas histórias que poderiam ter sido, mas não foram.
Em sua inocência e ignorância, o assim chamado amor platônico atribui a uma determinada pessoa o poder de produzir e exercer a força do amor naquele que espera.
Desse modo, o desejoso fica totalmente à mercê e dependente do outro, afogando-se no seu sonho ardoroso de amor ausente.
O poder da ação fica projetado no outro, de modo que a resolução está em perceber que Jaci só é percebido fora porque antes está dentro, fazendo parte de nossa força e poder.
Nossa amorosa índia e nosso bravo guerreiro, ao se unirem, nos fazem estrelas, protagonistas de nossa própria história.
Nosso índio nos conta que a flor vitória-régia, que significa rainha vitoriosa, é mais uma sabedoria indígena a nos apontar a união entre céu e terra, entre fora e dentro, entre o instinto e a razão, sendo mediados pela afetividade, aquela doçura e acolhimento que a gente vê em nossos índios, a base da personalidade brasileira.
Histórias e Lendas do Brasil (adaptado do texto original de Gonçalves Ribeiro). – São Paulo: APEL Editora, sem/data